Personalidade histórica e multifacetada
Sessão Álvaro Cunhal, o intelectual e o artista
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Intervenção de Jerónimo de Sousa, Secretário-Geral do PCP
Sábado, 14 de Dezembro de 2013Para além de militante e dirigente revolucionário, Álvaro Cunhal foi também um intelectual, um artista e um pensador das questões estéticas. Foram estas últimas vertentes que se evocou na sessão pública realizada no sábado, em Lisboa.
A data e o local escolhidos para esta sessão não podiam ser mais simbólicos. Foi precisamente a 14 de Dezembro de 1994, no mesmo hotel de Lisboa, o Hotel Altis, que Álvaro Cunhal reconheceu ser Manuel Tiago, o autor de «Até Amanhã, Camaradas», de «Cinco Dias, Cinco Noites» e de «A Estrela de Seis Pontas», em cujo lançamento ocorreu essa revelação.
No passado sábado, Jerónimo de Sousa começou por salientar precisamente o carácter multifacetado da personalidade de Álvaro Cunhal, que não só se interessou por várias esferas da acção humana como praticou as artes e a cultura: «Como artista, foi escritor, traduziu Shakespeare, pintor e, se não levou mais longe a sua paixão pela música, foi por manifesta incompatibilidade entre as exigências da arte e as suas condições de vida, na prisão e na clandestinidade», acrescentou o Secretário-Geral do PCP. Procurando discernir a razão de tal «traço de união entre o militante revolucionário e o artista», Jerónimo de Sousa arriscou: ele dever-se-á ao facto de, para Álvaro Cunhal, as artes «tenderem a ser, tal como a acção política revolucionária, formas de intervenção na transformação do mundo e da vida».
Tal unidade entre o artista e o revolucionário, salientou o dirigente do PCP, fica clara nas suas narrativas, nas pinturas e desenhos e nos principais textos sobre estética, como aqui já se evidenciou também. No caso da obra literária, precisou, a intervenção transformadora «lê-se no que mobiliza as personagens e nos acontecimentos que são recriados». Centrando-se particularmente em «Até Amanhã, Camaradas» e «Cinco Dias, Cinco Noites», que seriam «por si só provas suficientes do talento literário de Álvaro Cunhal», Jerónimo de Sousa lembrou que escreveu depois disso e até à sua morte.
Antes, já o Secretário-Geral do PCP tinha lembrado as palavras de Óscar Lopes no prefácio à 9.ª edição de «Até Amanhã, Camradas», no qual se questionava acerca das razões que levavam a que «um romance já tão lido e a vários títulos tão importante, tenha sido tão ignorado pela crítica?». A resposta está na necessidade que alguns tinham de esquecer e fazer esquecer o que a democracia devia aos comunistas. Para Jerónimo de Sousa, com as comemorações do centenário, pretendeu-se fazer precisamente o oposto: lembrar e não deixar esquecer o «legado revolucionário que a vida, o pensamento e a luta de Álvaro Cunhal constituem»
Arte e estética
No que respeita à obra plástica de Álvaro Cunhal, o Secretário-Geral do Partido salientou que também aí está presente a «vida do povo que sofre e luta está presente». No desenho e na pintura, acrescentou, Cunhal representou episódios da vida dos camponeses e dos pescadores, entre as quais se contam cenas de combate e luta, bem como de repressão e do apoio a feridos e mortos. Nos temas que abordou, afirmou ainda Jerónimo de Sousa, «expressa e evidencia sentimentos que vão da alegria à solidariedade na luta e na dor ou na tragédia, ao sofrimento e às dificuldades do quotidiano»; mas expressando, sempre, determinação, força colectiva e confiança no futuro.
Jerónimo de Sousa salientou ainda a teorização de Álvaro Cunhal sobre a arte e a estética, patente em discursos, artigos e ensaios. Desta teorização ressalta a rejeição de qualquer imposição de modelos estéticos ou escolas estéticas.
O dirigente do PCP guardou ainda umas palavras para contestar o rumo da política do Governo e da troika para o sector da cultura, marcado hoje por uma «profunda crise» e pelo «abandono de qualquer perspectiva real» de democratização.
Para além de Jerónimo de Sousa, interveio ainda o membro do Comité Central José Casanova. Houve ainda diversos – e emotivos – momentos culturais.